15 de mai. de 2011

Carta para um amigo nordestino diferenciado

Caro Xico Sá,
As coisas andam muito confusas em São Paulo. Eu sei, elas nunca foram fáceis para os nordestinos nem para os que sonham com uma cidadania decente nesta metrópole. Se uma presidente/presidenta do Brasil é eleita contrariando os desejos de uma grande parte dos paulistanos, a culpa é de quem? A cidade é suja, culpa de quem? Com a sujeira, bueiros entopem e quando chove, a cidade inunda, a culpa é de quem? O trânsito é infernal, culpa de quem? A violência não para de crescer, culpa de quem? É meu amigo, o nordestino é o novo judeu em São Paulo. Bom, nem sei se novo, porque esse preconceito é bem antigo.
    Mas mudando um pouco de assunto, essa metrópole está um abandono. Para poder ir na casa de uma amiga no Pacaembu, eu que estava na Consolação, percebi que o meio mais rápido era... Um táxi. O motorista foi conversando comigo, foi bem claro ao assumir - pelo menos isso! - que odeia esse "pessoal do Norte" e que as ruas de São Paulo parecem atualmente uma estrada rural.
    Fomos vendo o matagal alto, sem corte, muito lixo na rua e eu disse: “São Paulo está esquecida, mas os nordestinos nunca abandonaram essa cidade. Aliás, fizeram a memória desse lugar de Piratininga. Vieram, tiveram filhos, famílias, músicas e poesia e nunca nos deixaram. Nunca trataram essa cidade como o português colonizador que vinha, fazia seu lucro e voltava para sua terra. Eles ficam e eles fazem essa cidade uma pouco mais cosmopolita, a presença deles – em geral pobres economicamente, mas nem todos - é uma afronta aos muros cada vez mais altos dos condomínios fechados e ao elitismo cafona quatrocentão de alguns frustados (decadentes nunca, pois para isso precisariam ter passado pela civilização)".
    O motorista quis continuar o assunto sobre os absurdos que vivemos na cidade de hoje e já foi metendo o pau nos moradores de Higienópolis: “Aqueles judeus desgraçados, onde já se viu, impedirem o metrô de chegar até o bairro deles”. Novamente, vendo lá perto do cemitério do Araçá lugares escuros, repliquei: “Os judeus nem os moradores de Higienópolis são os responsáveis por esse dessarranjo. Os governantes é que ainda têm uma mentalidade longe do conceito de cidadania. Para o pessoal de M´Boi Mirim que quer ampliar a avenida que dá acesso á região central, nada. Para uma associação de Higienópolis, tudo. A culpa não é dos endinheirados do bairro nobre, mas da falta de nobreza de nossos governantes”.
    Nobreza essa que eu aprendi vendo um caboclo ponta de lança, nobreza essa que está nas mãos que construíram literalmente essa cidade, nobreza essa que li em seus textos sempre e na sua amizade, Xico. Parafraseando e modificando a frase: O nordestino não é um forte, é um nobre.
    Conclusão, o problema é com os pobres e como os nordestinos na cidade - nem todos – são pobres, eles ganham uma carga dupla de burrice histórica por parte dos chamados paulistanos. Quero deixar claro que nasci nessa cidade. E, Xico, como paulistano que gosta de receber as pessoas de fora em casa, quero te convidar para no sábado, 14, às 14 horas irmos lá em Higienópolis, que é a minha casa também, como é a sua, e fazermos um churrascão. Vai ter algo na Vilaboim e em frente ao Shopping Higienópolis. Depois, vamos comer baião de dois lá no largo de Pinheiros, que tem metrô.
De Victor Angelo, do Blogay da Folha de S. Paulo

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